Postagens mais visitadas

Boletim de ocorrencia para obter imagens do cftv do condomínio?

CFTV (Câmeras nas Áreas Comuns)

Boletim de ocorrencia imagens cftv area comum sindico

Uso de imagens do CFTV em áreas comuns como prova e a exigência de boletim de ocorrência

Alegitimidade jurídica na exigência formal para acesso a gravações condominiais

A LGPD, o Código Civil e os deveres do síndico na mediação de acesso às imagens

A recusa do síndico frente à pressão informal de condôminos. Você paga o salário do síndico? Ele é obrigado a te fornecer as imagens via whatsapp ou email ou pendrive?

PRESTA ATENÇÃO: Você mora em condomínio edilício, não num curral. Aqui tem lei, tem norma, tem regra, e você não é dono do mundo só porque paga condomínio.

As imagens geradas pelo sistema de CFTV são dados protegidos por lei, não são de acesso irrestrito, e não pertencem ao morador, mesmo que você ache que tudo no prédio é seu.

Quem controla essas imagens? O síndico, que age como representante legal do condomínio (art. 1.348 do Código Civil). Ele tem a obrigação de proteger a privacidade e garantir o uso legal dessas imagens.

Você quer as imagens? ENTÃO SIGA A LEI:

Não existe entrega via WhatsApp, e-mail ou pendrive sem critério legal. Não importa se você é morador, proprietário ou "manda-chuva":

✔️ Tem que justificar a solicitação.

✔️ Tem que indicar dia, hora e local exato do fato.

✔️ Tem que ter legítimo interesse.

✔️ E muitas vezes é necessário registrar um Boletim de Ocorrência (BO), principalmente quando envolve segurança, ameaça, dano, furto ou comportamento criminoso.

Isso porque o síndico pode responder judicialmente se entregar as imagens de forma errada. Ele não está a serviço pessoal de ninguém, está a serviço do interesse coletivo e da legalidade.

LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados - Lei nº 13.709/18). Você conhece essa lei? Provavelmente não. Mas ela protege os dados pessoais, inclusive imagens. A divulgação indevida pode gerar ação judicial, indenização, multa, danos morais. O síndico, se ceder imagens sem respaldo, pode responder civil e criminalmente. Portanto, ele não é obrigado e nem pode mandar vídeo nenhum "no zap" pra quem grita mais alto ou bate na porta.

"Eu pago o salário do síndico!" Errado. O síndico não tem "salário", ele recebe remuneração aprovada em assembleia. Ele responde ao condomínio, não a você individualmente. Ele tem deveres com a coletividade e com a lei, não com caprichos pessoais de morador exaltado. Então comece respeitando. Agir de forma agressiva, ameaçadora, sem educação, não te dá mais direitos — só te expõe a ser notificado, processado por assédio, ou até expulso judicialmente do condomínio em caso grave (art. 1.337, CC).

Se você precisa das imagens:

  • Solicite formalmente ao síndico.
  • Indique justificativa e dados específicos.
  • Registre BO se for caso de infração.
  • Espere análise e decisão formal, conforme as normas internas e a legislação.

Se continuar querendo tudo "do seu jeito", vá estudar a lei ou contrate um advogado. Porque no condomínio manda a norma, não o grito.

Vou usar dois exemplos ficticios, crônicas educativas, para ilustrar a questão de obter imagens do cftv do condomínio. Vamos lá... Ah... qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.

Você talvez conheça alguém como ele: Raimundo, morador antigo do Condomínio São Jorge. Figura conhecida, voz alta no grupo do WhatsApp, sempre dizendo que “paga o salário do síndico” e que “tem direito a tudo porque é proprietário”.

Certo dia, Raimundo descobriu que seu carro, um sedã prateado que ele tratava como relíquia, estava com um arranhão na lateral. Desceu furioso até a portaria, exigindo as gravações das câmeras. E foi direto ao ponto com o síndico:

— “Quero as imagens AGORA! Me manda no zap ou vou fazer escândalo nesse prédio!”

Do outro lado do balcão estava o seu José, o síndico, homem paciente, meticuloso e muito bem informado. Ele respirou fundo e respondeu:

— “Seu Raimundo, pra acessar as imagens o senhor precisa formalizar o pedido por escrito. E, nesse caso de dano ao patrimônio, é importante registrar um boletim de ocorrência.”

A resposta soou como provocação para Raimundo, que explodiu:

— “VOCÊ É PAGO COM O MEU DINHEIRO! VAGABUNDO! QUEM MANDA AQUI SOU EU!”

O grito ecoou, mas seu José se manteve sereno. Não cedeu.

Naquela noite, Raimundo levou sua indignação ao grupo de WhatsApp do condomínio. Disse que o síndico o havia desrespeitado, que estava "acobertando marginais" e que "escondia as câmeras". Esperava apoio. Mas o que veio foi silêncio. E então, a inesperada resposta de dona Tereza, moradora do 303, ex-delegada aposentada:

— “Raimundo, o que você está pedindo é ilegal do jeito que quer. As imagens das câmeras são protegidas pela LGPD. O síndico agiu exatamente como manda a lei. Ele não está ali pra obedecer ordem de morador exaltado. Ele responde legalmente pelos dados do condomínio.”

Ela continuou explicando, com toda a calma de quem já enfrentou tribunais e criminosos de verdade:

“Câmeras de áreas comuns são monitoradas pelo condomínio, não são públicas. Para ter acesso, precisa indicar data, hora, motivo, e em casos como o seu, é necessário fazer boletim de ocorrência. O síndico não pode te mandar vídeo por zap, pendrive ou e-mail como se fosse trailer de filme.”

Raimundo sentiu o baque. Mas algo ali tocou fundo. Pela primeira vez, calou-se. No dia seguinte, vestiu uma camisa polo azul, foi à delegacia, registrou o BO. Voltou à administração com o número da ocorrência e um requerimento formal em mãos.

Dois dias depois, assistiu à gravação das câmeras, na presença do síndico e da administradora. Nenhum condômino havia tocado em seu carro. O arranhão fora causado por um galho, solto durante a ventania do final de semana. O seguro do condomínio, felizmente, cobriu os danos.

Na assembleia do mês seguinte, todos esperavam que Raimundo voltasse a ser Raimundo. Mas ele pediu a palavra, levantou-se e, com voz firme, disse:

— “Quero agradecer ao seu José. Fui ignorante, fui grosseiro. E ele agiu certo. A gente tem que seguir as regras. Quem quiser imagem, que faça o pedido certo. Isso aqui é condomínio, não é favela.”

Ninguém esperava. Ele virou exemplo. A história de Raimundo passou a ser contada a cada reunião, virou modelo de cartilha. E ele, de figura temida, tornou-se respeitado.

E se você, leitor, ainda pensa que pode exigir câmera no grito, lembre-se: Raimundo já tentou. E aprendeu — do jeito certo — que em condomínio quem grita não manda. Quem respeita, constrói.

O outro exemplo ficitício para ilustrar é...

No Edifício Solar dos Ipês, tudo parecia tranquilo. Os moradores levavam suas vidas em paz, até que um dia, um simples pacote desaparecido desencadeou uma transformação coletiva.

Dona Clotilde, moradora do 301, sempre foi atenta — e um pouco curiosa demais. Observadora das rotinas alheias, acreditava que, por morar ali há mais de 20 anos, tinha certos “direitos especiais”. Quando recebeu uma notificação de entrega, desceu animada até a portaria. Para sua surpresa, não havia pacote algum. Sentiu-se lesada, enganada, e imediatamente procurou o síndico.

— Quero as imagens do corredor e da portaria agora! — exigiu, de dedo em riste. — Me mande por WhatsApp, ou salve num pendrive. Eu tenho o direito! Eu pago o seu salário!

O síndico, Sr. Gilberto, homem calmo e meticuloso, respondeu com firmeza:

— Dona Clotilde, entendo sua frustração. Mas, por lei, não posso fornecer imagens assim. Precisamos de um boletim de ocorrência, para registrar formalmente o fato. Sem isso, eu me torno responsável por qualquer exposição indevida.

Ela não quis saber. Foi embora bufando, acusando-o de estar "escondendo algo". Mas tudo mudou no fim de semana, quando sua neta Júlia, estudante de Direito, foi visitá-la. Dona Clotilde contou o episódio, esperando apoio. Em vez disso, recebeu uma explicação detalhada:

— Vó, as imagens das câmeras são consideradas dados pessoais. Mesmo em áreas comuns, a lei protege a imagem das pessoas. O condomínio não pode sair distribuindo gravações. Imagine se um vizinho expõe outro em grupo de WhatsApp? O síndico pode ser processado. É sério.

Foi o início da mudança.

Dona Clotilde, então, foi à delegacia. Registrou um boletim de ocorrência relatando o sumiço do pacote. Voltou ao síndico com o documento em mãos. O procedimento foi iniciado: registro, protocolo, verificação das gravações. A gravação foi preservada e, por segurança, enviada diretamente à delegacia. Clotilde, agora mais informada, entendeu o processo — e pela primeira vez, agradeceu a postura do síndico.

Pouco tempo depois, uma assembleia foi convocada. Um grupo de moradores exaltados reclamava: “Queremos acesso livre às câmeras. Somos donos do prédio!”. O síndico, pacientemente, explicou os riscos legais. Clotilde levantou-se. Disse com clareza:

— Eu também pensava assim. Mas aprendi que há regras. As imagens nos protegem, mas também podem prejudicar. Precisamos respeitar a lei.

A assembleia se calou. Muitos refletiram pela primeira vez.

Decidiram aprovar um novo regulamento. Um formulário de solicitação de imagens foi criado. Só com BO ou ordem judicial. Nada mais de “manda pelo zap”. Nada mais de “eu pago seu salário”. O síndico ganhou apoio. O sistema de segurança passou a ser visto com respeito.

Poucos dias depois, outro morador teve seu carro riscado. Furioso, exigiu as imagens. Queria o vídeo imediatamente. Diante da negativa, gritou: “Isso aqui é ditadura!”. Mas desta vez, foi Clotilde quem respondeu:

— Não é ditadura. É proteção. A lei é pra todos. Faça o boletim, siga o protocolo. É assim que se faz.

Com o tempo, o Edifício Solar dos Ipês virou exemplo. As imagens eram preservadas com rigor. As decisões eram documentadas. O síndico não era mais visto como subordinado, mas como gestor responsável. E Dona Clotilde, a antiga curiosa, se tornou a defensora da legalidade.

A história dela passou a ser contada aos novos moradores. Um exemplo de que conhecimento transforma. Que legalidade protege. E que, até mesmo os mais resistentes, podem aprender — e ensinar. 

A natureza jurídica da imagem como dado pessoal e o regime jurídico das gravações em áreas comuns

A imagem, enquanto projeção visual da identidade de um indivíduo, é reconhecida como direito fundamental à personalidade e à privacidade. A Constituição Federal assegura sua proteção no artigo 5º, inciso X, que consagra a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, estabelecendo a possibilidade de indenização no caso de violação. No contexto condominial, a discussão se intensifica com a disseminação de sistemas de Circuito Fechado de Televisão (CFTV) em áreas comuns. A instalação de câmeras tem respaldo na função de segurança coletiva, mas não exime o condomínio do respeito à legislação protetiva de dados. A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018), ao definir como dado pessoal qualquer informação relacionada à pessoa natural identificada ou identificável (art. 5º, I), abrange as imagens captadas pelas câmeras de segurança. Tal classificação torna imperativa a observância de normas específicas no tratamento dessas informações, inclusive quanto à sua finalidade, necessidade, adequação e segurança. A captação de imagens por câmeras instaladas em corredores, portarias, garagens e outras áreas comuns configura ato de tratamento de dados, conforme o artigo 5º, inciso X da LGPD. Nessa linha, o condomínio, por intermédio do síndico ou da administradora, assume o papel de controlador, com a obrigação de garantir que o tratamento esteja amparado por base legal válida, sendo a legítima expectativa de segurança coletiva a justificativa mais comum. O Supremo Tribunal Federal já decidiu que o direito à imagem deve ser equilibrado frente a outros direitos fundamentais, como a segurança e a propriedade. Em precedentes recentes, reforçou-se a tese de que a simples captação de imagem em local público ou de acesso comum, desde que não destinada à exposição ou difamação, não configura violação à intimidade.

No âmbito da jurisprudência do STJ, há entendimento de que a gravação em áreas comuns não invade a esfera da privacidade do indivíduo, pois não se trata de ambiente de exclusividade pessoal. A jurisprudência considera que a instalação de equipamentos de vigilância deve respeitar a proporcionalidade e não ser utilizada para fins discriminatórios, vexatórios ou de controle indevido sobre a vida dos condôminos. A distinção essencial reside no uso da imagem. Se o registro se destina à segurança, com acesso restrito e motivado, sua captação é legítima. Se, por outro lado, houver divulgação indevida, compartilhamento informal ou exposição sem amparo legal, pode-se configurar violação do direito à imagem e ensejar reparação civil. O uso adequado das imagens exige a fixação de políticas internas que definam prazos de armazenamento, condições de acesso, registro de solicitações e responsabilidade sobre o compartilhamento. A ausência desses elementos, além de comprometer a segurança jurídica do condomínio, pode caracterizar infração à LGPD, com repercussões civis e administrativas. Portanto, a presença de câmeras em áreas comuns deve ser acompanhada de critérios rigorosos de controle, baseados na função de proteção coletiva, nos princípios da transparência e minimização de dados e na delimitação do tratamento àquilo que for estritamente necessário. O condômino, por sua vez, ao adentrar essas áreas, consente implicitamente com a captação visual, desde que seu uso se mantenha dentro dos parâmetros legais.

A função do síndico diante da solicitação de acesso às gravações

A atuação do síndico, enquanto gestor legalmente designado do condomínio, está normativamente delimitada pelo artigo 1.348 do Código Civil. Entre suas atribuições, destaca-se a de representar ativa e passivamente o condomínio em juízo ou fora dele (inciso II) e zelar pela conservação e guarda das partes comuns (inciso V), o que inclui a custódia de sistemas de segurança como o CFTV. Ao exercer tais funções, o síndico assume o papel de controlador no tratamento de dados, conforme a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais. A solicitação de imagens gravadas por condôminos frequentemente coloca o síndico em uma posição de pressão social e expectativa de resposta imediata. No entanto, o acesso não pode ocorrer por mera conveniência individual. A legislação impõe uma conduta diligente e fundamentada: a liberação de imagens só se justifica diante de uma motivação legítima, como a elucidação de fatos potencialmente delituosos, a proteção de direitos ou o atendimento a ordem judicial.

A LGPD, ao tratar da segurança do tratamento de dados (art. 46), exige a adoção de medidas técnicas e administrativas aptas a proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas. O fornecimento de gravações sem um protocolo formal, como boletim de ocorrência ou requisição oficial, pode ser interpretado como tratamento indevido, ensejando responsabilidade do controlador, ou seja, do próprio síndico. Além disso, o artigo 6º da LGPD consagra os princípios da necessidade e da minimização. Isso significa que, ainda que haja solicitação por parte de um condômino, o fornecimento integral de imagens deve ser evitado, limitando-se ao estritamente necessário. Cabe ao síndico avaliar o pedido e, se legítimo, registrar a solicitação, preservar a integridade do material e encaminhá-lo às autoridades competentes ou ao próprio requerente, mediante as devidas salvaguardas.

A jurisprudência do STJ tem reforçado a posição de que o administrador condominial deve atuar com cautela diante de demandas que envolvam a proteção de direitos fundamentais, mesmo em contextos de aparente simplicidade. A entrega informal de material sensível, como imagens de CFTV, sem documentação oficial, compromete não apenas a segurança jurídica do condomínio, mas também a integridade do síndico enquanto agente responsável. É essencial compreender que o síndico não atua como servidor público ou empregado subordinado aos condôminos, mas sim como mandatário coletivo, eleito em assembleia, devendo obediência à convenção, ao regimento interno e à legislação aplicável. 

O argumento de que "eu pago seu salário" não apenas é juridicamente irrelevante, mas revela uma distorção do papel institucional do gestor condominial. A adoção de um regulamento interno de proteção de dados, aprovado em assembleia, pode conferir maior segurança jurídica e previsibilidade ao processo de solicitação de imagens. Esse regulamento deve conter critérios objetivos, prazos de resposta, exigência de formalização documental e responsabilização por uso indevido das imagens obtidas. A transparência e a impessoalidade, nesses casos, são instrumentos de blindagem contra práticas autoritárias, pressões pessoais ou interpretações arbitrárias. É dever do síndico manter registro documentado de todas as solicitações e respectivas decisões, incluindo justificativas para eventuais indeferimentos. Essa conduta coíbe alegações de omissão e permite o controle posterior por auditoria ou assembleia, consolidando a legitimidade da gestão frente aos condôminos e aos órgãos fiscalizadores.

A (i)legitimidade de solicitações informais e a exigência de boletim de ocorrência

A requisição informal de imagens do circuito interno de segurança, com base em vínculos interpessoais, conveniência ou pressão subjetiva, é juridicamente improcedente e representa risco elevado à responsabilidade civil e administrativa do condomínio e, especialmente, do síndico. A legislação brasileira impõe, de forma categórica, a formalização do pedido e a demonstração de interesse legítimo na obtenção da gravação. A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), em seu artigo 7º, delimita as hipóteses legais para o tratamento de dados pessoais. O inciso II autoriza o tratamento quando necessário para o cumprimento de obrigação legal ou regulatória, enquanto o inciso VI permite o tratamento para exercício regular de direitos em processo judicial, administrativo ou arbitral. Em ambos os casos, exige-se motivação formal e documentada, o que exclui a possibilidade de fornecimento mediante simples mensagem de WhatsApp, email informal ou solicitação verbal. Além disso, o fornecimento de imagem sem respaldo documental compromete a cadeia de custódia da prova, inviabilizando sua utilização posterior em juízo, além de fragilizar a posição do condomínio frente a eventual ação indenizatória por uso indevido. A exigência de boletim de ocorrência, portanto, não é uma exigência arbitrária, mas sim uma garantia de segurança jurídica e de conformidade com a legislação vigente. Esse documento assegura que há fato concreto a ser apurado e permite ao síndico agir dentro dos limites da legalidade, protegendo tanto os dados quanto os direitos dos demais condôminos.

A jurisprudência pátria reconhece que o fornecimento de registros sensíveis só é admitido diante de risco concreto, apuração de ilícito ou interesse jurídico relevante, e não em função de curiosidade, suspeitas pessoais ou conflitos interpessoais. O Superior Tribunal de Justiça, em diversas decisões, afastou pretensões de acesso indiscriminado a dados sob a justificativa de proteção à privacidade dos demais envolvidos e da necessidade de controle sobre a finalidade do uso das imagens. 

A informalidade na entrega do conteúdo captado pode configurar falha no dever de guarda e zelo do síndico, ensejando responsabilização pessoal. A doutrina especializada e os pareceres técnicos mais atuais convergem no sentido de que o fornecimento de gravações sem requisitos formais constitui tratamento ilícito de dados, sujeitando o condomínio às sanções previstas no artigo 52 da LGPD, incluindo advertência, multa e obrigação de publicização da infração. O argumento comumente usado por condôminos – “eu pago o seu salário” – não encontra qualquer amparo legal e distorce o regime jurídico da administração condominial. O síndico é mandatário, não subordinado, e age conforme previsão normativa e deliberação assemblear. A simples titularidade de unidade autônoma não confere prerrogativa de comando direto sobre as funções do síndico, tampouco o direito de violar a privacidade de terceiros. O fornecimento de cópia das gravações deve ocorrer em três situações principais: (i) por ordem judicial; (ii) mediante requisição policial com base em inquérito formalizado; ou (iii) com apresentação de boletim de ocorrência detalhado, no qual conste o dia, horário aproximado e local da suposta ocorrência. A autorização assemblear não exime a exigência desses elementos, pois a LGPD prevalece sobre a deliberação da maioria em matéria de proteção de dados.

Ainda que as gravações digam respeito ao próprio requerente, não se pode ignorar que outras pessoas podem ter sido incidentalmente captadas nas imagens, e isso impõe uma análise de proporcionalidade e necessidade. O fornecimento integral sem edição ou anonimização pode configurar violação ao direito de terceiros.

Portanto, ao exigir boletim de ocorrência, o síndico não está criando obstáculos arbitrários, mas cumprindo um dever de cautela e legalidade. A recusa fundamentada não é omissão, mas exercício legítimo da função administrativa dentro do marco regulatório que protege tanto a coletividade quanto o próprio requerente.

Imagens como meio de prova: requisitos legais e processuais

A utilização de gravações de câmeras de segurança como prova em processos judiciais é amplamente admitida no ordenamento jurídico brasileiro, desde que respeitados critérios técnicos e legais quanto à licitude, autenticidade e relevância. O artigo 369 do Código de Processo Civil estabelece que “as partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa”. Isso inclui imagens captadas por CFTV, desde que obtidas de forma regular. A gravação de áreas comuns em condomínios é, em regra, lícita quando realizada com conhecimento dos condôminos e para fins de segurança. Todavia, para que essa prova tenha valor em juízo, é necessário preservar a cadeia de custódia da imagem, assegurando que não houve edição, manipulação ou quebra de integridade do conteúdo. A jurisprudência é clara ao exigir a demonstração da autenticidade da mídia apresentada e a comprovação de que foi armazenada de forma segura e controlada.

É fundamental que o condomínio estabeleça procedimentos internos para a coleta, guarda e fornecimento de imagens, com registro de datas, horários, responsável técnico e assinaturas em termo de responsabilidade. Tais precauções não apenas fortalecem o valor probatório da gravação, como também resguardam o condomínio de acusações de má-fé ou parcialidade.

Em casos judiciais, a imagem é considerada prova técnica, e sua apresentação deve vir acompanhada de laudo pericial ou, ao menos, de declaração circunstanciada da origem e do meio de captação. Nos termos do artigo 441 do CPC, é admissível a exibição de documento ou coisa em poder da parte contrária ou de terceiro, mediante requerimento fundamentado, reforçando a possibilidade de que o condomínio seja compelido a apresentar as imagens, desde que haja pertinência com o objeto da ação.

O fornecimento voluntário pelo síndico diretamente ao condômino, contudo, sem formalização, compromete a idoneidade da prova e pode configurar quebra da confidencialidade. O risco de adulteração e uso indevido é real, sobretudo quando as gravações são encaminhadas por canais informais como aplicativos de mensagens ou e-mail pessoal. A conduta mais segura é a entrega sob protocolo, mediante termo de ciência e compromisso, ou o envio direto à autoridade responsável pela investigação ou ao juízo requisitante. Outro ponto relevante é a análise do contexto: para que a imagem seja válida como prova, ela deve demonstrar de forma clara o fato alegado. A jurisprudência desconsidera vídeos imprecisos, de baixa resolução ou que não capturam a integralidade do evento, por entender que não oferecem convicção suficiente ao julgador. Em situações sensíveis, a apresentação de imagens deve ser acompanhada de requerimento de sigilo processual, nos termos do artigo 189, I, do CPC, a fim de proteger os direitos de terceiros envolvidos. A utilização de imagens em juízo também deve observar a proibição da obtenção por meio ilícito. Gravações feitas com câmeras ocultas, em locais de acesso restrito ou sem o consentimento necessário, ainda que tecnicamente válidas, são desconsideradas como provas válidas, nos termos do artigo 5º, inciso LVI, da Constituição Federal. Quando a imagem capturada atesta um ilícito penal, o procedimento adequado é a apresentação da gravação às autoridades policiais, acompanhada de boletim de ocorrência. O condomínio pode ser parte relevante na persecução penal, mas não deve substituir o aparato estatal na investigação, tampouco assumir responsabilidade pela produção da prova de forma informal.

Embora as imagens do CFTV condominial constituam meio probatório legítimo, sua eficácia depende do respeito às formalidades legais, da preservação da integridade do arquivo e da demonstração inequívoca de sua pertinência com os fatos em litígio. O síndico, nesse cenário, não é parte no mérito da controvérsia, mas agente de garantia da legalidade e da isonomia no acesso à prova.

Deliberações assembleares e limites legais à exposição

A assembleia condominial é o órgão soberano no âmbito interno da coletividade condominial. Contudo, sua soberania não é absoluta: está sujeita aos limites legais, especialmente quando confrontada com direitos fundamentais dos condôminos, como a intimidade, a honra, a imagem e a proteção de dados pessoais. As deliberações que envolvem o uso do sistema de vigilância e a política de acesso às gravações devem respeitar o princípio da legalidade estrita. Mesmo quando a assembleia aprova, por maioria qualificada, a instalação de câmeras e a adoção de políticas de segurança, essas decisões não podem ultrapassar os limites impostos pela legislação civil e, notadamente, pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). A legalidade do tratamento de imagens depende de bases jurídicas previstas expressamente na LGPD, e não da simples vontade da maioria.

A convenção condominial pode regulamentar o uso do CFTV, determinar o tempo de armazenamento das imagens, indicar os responsáveis pelo acesso, e fixar critérios mínimos para solicitações. Entretanto, essa normatização interna deve ser compatível com os princípios da finalidade, necessidade, adequação e segurança previstos no artigo 6º da LGPD. A mera aprovação assemblear de acesso irrestrito às imagens é inválida, pois fere a proporcionalidade e abre margem para violações à privacidade de terceiros.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem reafirmado que a coletividade não pode suprimir direitos individuais indisponíveis sob o pretexto de deliberação democrática. A segurança coletiva não justifica o abandono do princípio da dignidade da pessoa humana, pilar fundante da Constituição Federal. Assim, deliberações assembleares que autorizam o fornecimento de imagens sem formalização adequada, ou que dispensam a justificativa fundamentada para seu uso, são nulas de pleno direito.

A proteção conferida pela LGPD não se limita à pessoa que solicita ou é o foco da gravação. Ela se estende a todos os que, incidentalmente, aparecem no vídeo. Assim, ao deliberar sobre o uso das imagens, a assembleia deve considerar os impactos coletivos e a impossibilidade de prever todos os cenários de uso futuro. O risco de exposição indevida em redes sociais, grupos de mensagens e uso vexatório é real e tem sido reconhecido pelos tribunais como fator de responsabilização civil e administrativa.

Também é ilegal qualquer deliberação que condicione o fornecimento de imagens ao pagamento de taxa adicional, exceto quando se tratar de cópia formal autenticada com custos operacionais justificados. A jurisprudência já reconheceu como abusiva a exigência de pagamento para o exercício de direitos fundamentais, como o acesso à prova ou à informação necessária à defesa de direitos em juízo.

Por outro lado, a assembleia pode – e deve – aprovar políticas de compliance e boas práticas voltadas à proteção de dados. Isso inclui: definição de prazo máximo para armazenamento, protocolos de anonimização quando necessário, indicação de responsável interno pela segurança das informações (que pode ser o próprio síndico ou a administradora), além de mecanismos de auditoria periódica. A transparência nessas decisões deve ser comunicada aos condôminos de forma clara, com registros em ata e disponibilização de regulamento interno. É importante destacar que decisões assembleares que resultem em uso discriminatório, punitivo ou vexatório das gravações, mesmo que aprovadas por maioria, são passíveis de nulidade judicial. Os tribunais têm reconhecido que o uso de imagens com o objetivo de perseguir, intimidar ou difamar condôminos constitui abuso de direito e fere o princípio da função social da propriedade.

Embora a assembleia condominial detenha competências para regular a convivência e a segurança no ambiente comum, essas decisões não estão acima do ordenamento jurídico. A proteção da privacidade e o respeito à legalidade são balizas intransponíveis, devendo orientar toda e qualquer deliberação que envolva o uso de dados sensíveis, como as imagens do sistema de vigilância.

Recusa justificada e o argumento “eu pago seu salário”

O exercício da função de síndico está submetido a um regime jurídico próprio, definido pelo Código Civil e pela convenção condominial, e não por laços de subordinação direta aos condôminos. A afirmação de que o condômino “paga o salário do síndico” é juridicamente infundada e revela profunda incompreensão sobre a natureza da função administrativa exercida no condomínio.

O síndico é eleito por assembleia, nos termos do artigo 1.347 do Código Civil, e atua como mandatário do condomínio, com poderes definidos em lei e na convenção. Não há vínculo empregatício, tampouco relação hierárquica de comando por parte dos condôminos. Sua responsabilidade é funcional, e não pessoal. Isso significa que suas decisões devem observar o interesse coletivo e o ordenamento jurídico, e não ceder a pressões individuais ou chantagens emocionais.

Quando um condômino exige o fornecimento de imagens de CFTV sem os requisitos legais, o síndico tem não apenas o direito, mas o dever de recusar. Essa negativa, desde que fundamentada, não configura omissão ou descaso, mas sim cumprimento das normas legais de proteção de dados e responsabilidade civil. A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais impõe ao controlador – papel exercido pelo síndico – o dever de adotar medidas preventivas e de prestar contas (art. 6º, incisos VII e X da LGPD). Isso inclui recusar acessos informais ou não justificados. A jurisprudência já consolidou que a atuação prudente do administrador, especialmente quando envolve direitos fundamentais, é um fator de exclusão da responsabilidade pessoal. Em decisão recente, o STJ reconheceu a legitimidade da recusa de fornecimento de informações sensíveis sem amparo legal, destacando que o síndico não está sujeito à vontade isolada de um condômino, mesmo que majoritário.

A retórica agressiva contra o síndico – em especial a acusação de “não cumprir ordens” – frequentemente revela tentativa de abuso de poder econômico ou social. Tal postura pode, inclusive, configurar infração ao dever de urbanidade e respeito mútuo, previsto em muitos regimentos internos, sendo passível de advertência ou multa se reiterada em assembleias ou comunicações oficiais.

Importante frisar que a atuação do síndico não se limita à execução de ordens, mas exige constante juízo de legalidade, conveniência e prudência. A decisão de não fornecer determinada imagem pode decorrer da presença de terceiros no vídeo, da ausência de registro formal, da prescrição do prazo de armazenamento ou mesmo da constatação de que o pedido tem motivação pessoal e revanchista. Nesses casos, a recusa protege não só o condomínio, mas o próprio requerente, evitando que ele cometa atos de exposição indevida, calúnia ou uso impróprio de conteúdo audiovisual.A lei não exige que o síndico atue como reprodutor imediato de demandas, mas como agente responsável, dotado de discernimento técnico e jurídico. A entrega informal de imagens é uma conduta temerária, pois abre margem para responsabilização por violação de direitos de terceiros e por uso indevido do conteúdo. Ainda que o condômino alegue ser o único envolvido, a imagem pode capturar rostos, placas ou movimentos de outras pessoas, configurando dado pessoal sensível protegido por lei. Portanto, o síndico deve se manter firme na preservação dos limites institucionais da sua função. A recusa justificada é um ato de administração responsável, e não afronta ao condômino. As deliberações devem sempre se basear em protocolo, análise de risco e conformidade legal, e não em pressões individuais, por mais veementes que sejam. A autoridade do síndico reside justamente em sua capacidade de intermediar os interesses da coletividade sob o manto da legalidade e da razoabilidade.

Propostas práticas para a gestão transparente e segura do CFTV

A administração condominial moderna exige que o sistema de videomonitoramento seja gerido não apenas como ferramenta de segurança patrimonial, mas como estrutura de tratamento de dados sensíveis. Para tanto, o condomínio deve adotar medidas normativas, técnicas e operacionais que garantam a conformidade legal, a proteção à privacidade e a segurança da informação, prevenindo abusos e responsabilizações indevidas.

A primeira medida essencial é a instituição de um regulamento interno específico para o uso do CFTV. Este documento deve ser aprovado em assembleia, com quórum e forma compatíveis com a convenção, e conter regras claras sobre:

  • Objetivo do monitoramento (proteção da integridade física e do patrimônio);

  • Locais de instalação (vedada captação em ambientes privados ou de uso exclusivo);

  • Tempo de retenção das imagens (geralmente entre 15 e 30 dias, conforme capacidade técnica);

  • Condições de acesso (boletim de ocorrência, requisição judicial ou policial formal);

  • Proibição de acesso informal (inclusive por síndico, administradora ou conselheiros sem justificativa registrada);

  • Procedimentos de anonimização, se necessário, quando terceiros não envolvidos aparecem nas imagens solicitadas.

É igualmente recomendável a criação de um formulário padronizado de solicitação de imagens, contendo:

  • Identificação do requerente;

  • Justificativa do pedido;

  • Descrição do fato (data, horário, local aproximado);

  • Cópia do boletim de ocorrência ou documento oficial correlato;

  • Assinatura de termo de responsabilidade pelo uso da imagem.

Esse protocolo, além de resguardar o condomínio juridicamente, fortalece a percepção de equidade e impessoalidade da gestão. A centralização do atendimento em canais oficiais (ex: email institucional, protocolo físico ou digital com número de controle) evita decisões subjetivas e improvisadas.

Outra prática eficaz é a capacitação periódica do síndico, do corpo diretivo e da administradora sobre LGPD, direito condominial e boas práticas em segurança da informação. Esses treinamentos, ministrados por advogados ou consultores especializados, reduzem significativamente os riscos de atuação negligente e facilitam a padronização da conduta.

É prudente ainda que o condomínio estabeleça parceria com empresa de segurança ou tecnologia que implemente soluções de criptografia, backup automático e restrição de acessos ao sistema de gravação. Os registros de log do sistema devem estar disponíveis para auditoria, assegurando que apenas pessoas autorizadas tenham acesso ao conteúdo sensível.

Em casos de litígio, o condomínio deve sempre priorizar o envio das imagens diretamente à autoridade requisitante ou ao juízo, nunca ao requerente, salvo quando comprovadamente necessário e autorizado em condições controladas. Essa prática reduz o risco de uso indevido ou manipulação posterior do material.

Por fim, é recomendável incluir no relatório de prestação de contas anual uma seção dedicada à gestão do sistema de segurança, informando sobre:

  • número de solicitações recebidas e atendidas;

  • registros de incidentes envolvendo imagens;

  • atualizações no regulamento ou infraestrutura do CFTV;

  • gastos relacionados à manutenção e armazenamento.

Essa transparência administrativa reforça a legitimidade da atuação do síndico, protege o condomínio de litígios futuros e demonstra diligência ativa na proteção dos dados dos condôminos e visitantes. Assim, ao adotar uma abordagem sistêmica, preventiva e profissionalizada sobre o uso de imagens em áreas comuns, o condomínio se alinha aos padrões legais mais exigentes, assegura a eficácia da sua política de segurança e promove a confiança entre seus membros, consolidando um ambiente de respeito mútuo e integridade institucional. Muito obrigada por acompanhar esta leitura até o final.

Espero que esta leitura tenha proporcionado mais do que esclarecimento: que tenha gerado reflexão, empatia e a percepção de que a convivência em condomínio exige, acima de tudo, respeito à legalidade, aos direitos dos demais e à função institucional de quem atua na gestão. Nos ambientes coletivos, o conhecimento jurídico não é um luxo – é uma ferramenta essencial de harmonia e justiça. Quando cada morador entende seus limites e deveres, todos ganham: segurança, previsibilidade e paz social.

Se você é síndico, membro de conselho, condômino ou administrador e busca orientação clara, firme e com base jurídica sólida, conte comigo. Estou à disposição para consultorias, pareceres, revisões de regimentos e convenções, suporte em assembleias, notificações, defesas técnicas e apoio total à administração condominial e institucional.

Sou a Dra. Patrícia Pereira Moreno, advogada, OABs 91.784/PR, 110.913A/RS e 132.664/SP.

📞 Telefone: +55 11 94350-9099

📧 E-mails: dra.patriciapereiramoreno@gmail.com

Especialista desde 1997 com sólida formação em Direito Digital, Perícia Digital Forense, Direito Imobiliário e Direito Civil e Processual Civil pela OAB SP. Com atuação incisiva e estratégica, presto suporte jurídico completo a associações, residenciais, comerciais e empreendimentos da construção civil.

Reconhecida por agilidade, criatividade e combatividade, tenho orgulho de ser referência nacional em Soluções Jurídicas Assertivas e de oferecer o mais completo apoio jurídico do Brasil em Direito Condominial e Associativo, com atuação em SP, PR, RS, MG, MS, DF, BA, SC e Lisboa/Portugal.

Vamos juntos construir ambientes jurídicos mais saudáveis, equilibrados e eficazes.

Nenhum comentário:

Postar um comentário