O Síndico quer construir uma piscina na área comum e não consta aprovação na ata da assembleia. Ele pode fazer isso?
Do Voto à Execução: O Caminho Legal para Qualquer Obra em Condomínio
Piscinas, Problemas e Processos: Como o Sonho do Lazer Virou Pesadelo Judicial
A Piscina que Virou Processo: Como uma Obra Irregular Transformou um Condomínio em Campo de Batalha Judicial
Olá, Seja bem vido querido leitor.
A construção de uma piscina em área comum de um condomínio sem a devida aprovação em assembleia específica, conforme estipulado pelo Código Civil brasileiro, configura uma infração legal e estatutária. Tal ação pode acarretar responsabilizações civis e administrativas para o síndico, além de gerar conflitos internos e possíveis prejuízos financeiros para o condomínio.
Vamos ver o que o código civil positiva:
Art. 1.341. A realização de obras no condomínio depende:
I. se voluptuárias, de voto de dois terços dos condôminos;
II. se úteis, de voto da maioria dos condôminos.
§ 1º As obras ou reparações necessárias podem ser realizadas, independentemente de autorização, pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer condômino.
§ 2º Se as obras ou reparos necessários forem urgentes e importarem despesas excessivas, determinada sua realização, o síndico ou o condômino que tomou a iniciativa delas dará ciência à assembleia, que deverá ser convocada imediatamente.
§ 3º Não sendo urgentes, as obras ou reparos necessários, que importarem despesas excessivas, somente poderão ser efetuadas após autorização da assembleia, especialmente convocada pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer dos condôminos.
§ 4º O condômino que realizar obras ou reparos necessários será reembolsado das despesas que efetuar, não tendo direito à restituição das que fizer com obras ou reparos de outra natureza, embora de interesse comum.
Art. 1.342. A realização de obras, em partes comuns, em acréscimo às já existentes, a fim de
lhes facilitar ou aumentar a utilização, depende da aprovação de dois terços dos votos dos condôminos, não sendo permitidas construções, nas partes comuns, suscetíveis de prejudicar a utilização, por qualquer dos condôminos, das partes próprias, ou comuns.
Então no tocante a obra para construir uma piscina:
§ 3º Não sendo urgentes, as obras ou reparos necessários, que importarem despesas excessivas, somente poderão ser efetuadas após autorização da assembleia, especialmente convocada pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer dos condôminos.
DEVE HAVER ASSEMBLÉIA ESPECÍFICA PARA TRATAR TAL ASSUNTO. De acordo com o artigo 1.341 do Código Civil, as obras em condomínios são classificadas em três categorias: necessárias, úteis e voluptuárias. As obras voluptuárias, como é o caso da construção de uma piscina, são aquelas realizadas para mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem. Para a realização de obras voluptuárias, é exigida a aprovação de dois terços dos condôminos em assembleia especialmente convocada para esse fim.
A ausência dessa aprovação torna a obra irregular, independentemente de sua execução ou conclusão. O síndico que realiza obras sem a devida autorização assemblear incorre em violação dos deveres legais e estatutários, podendo ser responsabilizado por danos materiais e morais decorrentes da obra não autorizada. Além disso, os condôminos podem convocar assembleia para destituir o síndico que age em desconformidade com suas atribuições. A jurisprudência brasileira tem reiteradamente reconhecido a ilegalidade de obras realizadas sem a aprovação necessária. Por exemplo, o Tribunal de Justiça de São Paulo, em Apelação Cível, condenou um síndico a indenizar o condomínio por obras realizadas sem autorização, causando danos à estrutura do edifício. Da mesma forma, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais reconheceu a necessidade de quórum qualificado para aprovação de obras voluptuárias, invalidando deliberação que não observou tal exigência.
Diante da intenção de realizar obra voluptuária, como a construção de uma piscina, recomenda-se que o síndico convoque uma assembleia extraordinária com pauta específica sobre a obra proposta. Durante a assembleia, deve-se apresentar um projeto detalhado, incluindo orçamento, impacto nas áreas comuns e eventuais alterações na convenção condominial. A aprovação deve ocorrer por dois terços dos condôminos, conforme exigido pelo Código Civil. Todas as deliberações devem ser registradas em ata, assinada pelos presentes e arquivada adequadamente.
Para exemplificar vou usar um caso ilustrativo, uma construção ficcional, elaborada exclusivamente para fins didáticos, ilustrativos e analíticos, com
o objetivo de contextualizar juridicamente a aplicação normativa em situações práticas de administração condominial. Os nomes, personagens, locais e eventos descritos são inteiramente fictícios, e qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou falecidas, instituições, fatos concretos ou ocorrências contemporâneas será mera coincidência. Trata-se de um recurso metodológico, amplamente aceito na doutrina e na literatura especializada, que visa promover o entendimento das normas legais pertinentes à atuação do síndico, à gestão das áreas comuns e à imprescindibilidade do cumprimento dos requisitos formais exigidos pela legislação civil e pelos regimentos internos dos condomínios edilícios. Vamos lá...
"Em uma ensolarada manhã de setembro, na pacata e charmosa cidade de Santa Clara do Sul, interior do Brasil, os moradores do Condomínio Residencial Vale Verde dos Sonhos acordaram com uma movimentação incomum. Caminhões, operários, sacos de cimento, estruturas metálicas, cercas de proteção e placas de “OBRA EM ANDAMENTO” começavam a tomar conta da área comum dos fundos do edifício, um terreno há anos negligenciado, onde mal cresciam algumas ervas daninhas entre pedras e concreto rachado. No entanto, o que parecia, à primeira vista, um novo e promissor capítulo para o condomínio, logo se tornaria um caso emblemático de como boas intenções, quando conduzidas fora da legalidade, podem desencadear uma verdadeira tempestade comunitária. Tudo começou poucos meses antes, quando José Fulano, um morador de personalidade expansiva e discurso articulado, foi eleito síndico com promessas de transformar o condomínio. Sua campanha destacava-se pela retórica de renovação, eficiência e valorização patrimonial. Entre suas propostas mais comentadas estava a tão sonhada construção de uma piscina: ampla, moderna, com borda infinita, área de solarium e duchas ao lado — um verdadeiro oásis residencial. Em suas palavras, “o Vale Verde dos Sonhos será sinônimo de lazer, saúde e convivência.” E a maioria dos condôminos, encantada com a proposta, depositou nele confiança e poder. Entretanto, mal assumiu o cargo, José Fulano já começou a agir com autonomia exagerada. Contratou uma empresa de engenharia civil local, aprovou o projeto arquitetônico, orçou os custos com fornecedores, e ainda determinou a cobrança de uma taxa extra de R$ 1.850,00 por unidade para custear a obra. Tudo isso sem realizar o que o Código Civil exige como obrigatório em situações desse tipo: a convocação de uma assembleia extraordinária, com pauta específica e deliberação registrada em ata, exigindo o quórum de dois terços dos condôminos, conforme o artigo 1.341, inciso I, que trata de obras voluptuárias — aquelas que são destinadas ao embelezamento ou lazer, mas não são essenciais à manutenção ou segurança do prédio. A movimentação das obras não demorou a chamar a atenção de moradores mais atentos. Dona Lurdes, moradora do 403, uma aposentada que havia sido professora de Direito por mais de 30 anos na Universidade Estadual, foi uma das primeiras a levantar a voz. Solicitou à administração cópias das atas das reuniões que teriam aprovado a obra, mas recebeu como resposta apenas silêncio e evasivas. Inconformada, buscou apoio de outros condôminos e organizou uma reunião informal na área de churrasqueiras. Mais de 20 pessoas compareceram. Muitos estavam assustados com a cobrança extra, outros indignados com a forma unilateral com que a decisão havia sido tomada. Alguns nem sequer sabiam que a obra seria uma piscina. A mobilização resultou em uma ação judicial. Um grupo de oito condôminos protocolou, com apoio jurídico especializado, um pedido de tutela antecipada de urgência para paralisação da obra. No pedido, argumentaram que a ausência de deliberação assemblear violava o disposto no Código Civil, e que os valores cobrados estavam sendo utilizados sem autorização coletiva, configurando possível má gestão financeira e administrativa. Em tempo recorde, o juiz da 3ª Vara Cível concedeu a liminar: suspendeu imediatamente as obras e determinou que nenhuma nova despesa fosse feita até que uma assembleia extraordinária fosse regularmente convocada. O impacto foi imediato. A construtora abandonou o local, exigindo pagamento de multa contratual. O condomínio ficou com a área escavada, sujeita à erosão e acúmulo de água parada — o que trouxe problemas sanitários e risco de proliferação de mosquitos. A tensão entre os moradores aumentou. A confiança na gestão desmoronava a cada dia. Os grupos de mensagens se tornaram espaços de debates acalorados. Alguns defendiam José Fulano, afirmando que “ao menos ele fazia alguma coisa”. Outros exigiam sua renúncia imediata. Houve até boletins de ocorrência registrados por ameaças verbais durante reuniões de garagem. Pressionado por todos os lados, José Fulano convocou uma assembleia extraordinária, já tarde demais. Com quórum elevado e participação recorde, a maioria dos moradores votou pela sua destituição imediata. No mesmo encontro, decidiu-se pela contratação de uma síndica profissional para assumir a administração até o fim do mandato. E foi assim que Dra. Dalva, advogada especialista em Direito Imobiliário e Gestão Condominial, com anos de experiência na capital, foi chamada para assumir o desafio de reerguer o Residencial Vale Verde dos Sonhos. Desde o primeiro dia, Dra. Dalva imprimiu uma nova cultura administrativa no condomínio. Revisou todos os contratos firmados por José Fulano, renegociou a dívida com a construtora, estancou os prejuízos financeiros e conduziu assembleias mensais com ampla divulgação, atas digitais, sistema de votação eletrônica e relatório de prestação de contas trimestral. Criou um canal de ouvidoria com acesso direto ao conselho fiscal, implantou um programa de educação condominial com oficinas mensais sobre cidadania, sustentabilidade, direitos e deveres do condômino. E, principalmente, instituiu um novo regimento interno baseado em práticas de governança, ética e transparência, tudo validado conforme os critérios das normas ABNT NBR 5674 e 16280. Dois anos após o episódio da piscina, o condomínio passou por uma reestruturação completa. Em assembleia legítima, com quórum qualificado e ampla participação, os moradores aprovaram um projeto reformulado para uso do espaço antes abandonado. Em vez de piscina, foi instalado um espaço multiuso: uma horta urbana coletiva, uma sala de coworking aberta em horário comercial com internet compartilhada, uma área de recreação infantil com brinquedos de madeira sustentável, bancos ergonômicos e uma pequena biblioteca comunitária. O projeto, inclusive, foi premiado em um concurso inovação e bem estar condominial. Hoje, o nome de José Fulano aparece apenas nos arquivos da história administrativa do condomínio, como um exemplo clássico de como a ausência de respaldo legal e respeito aos mecanismos democráticos pode transformar boas intenções em grandes problemas. O episódio não só marcou a memória coletiva dos moradores, como também se tornou uma referência local sobre a importância de uma gestão condominial responsável, ética e juridicamente embasada. Sob a liderança de Dra. Dalva, o Vale Verde dos Sonhos tornou-se não apenas um espaço habitacional, mas um verdadeiro laboratório de convivência, legalidade e inovação condominial. Ao caminhar hoje pelo pátio reformado do condomínio, é comum ver placas de sinalização com dizeres que parecem simples, mas carregam a sabedoria conquistada por meio da experiência: “Neste espaço, tudo é decidido por todos.” E mais adiante: “Sem assembleia, não há ação.” São lembretes visíveis de que a democracia condominial não é um formalismo, mas o alicerce de qualquer projeto que deseje florescer com raízes fortes, em solo seguro e com frutos duradouros para todos. E assim, o que começou como uma promessa mal executada, transformou-se, com esforço coletivo e conhecimento técnico, em uma história de excelência na gestão do condomínio."
O encerramento desta análise não poderia omitir uma das dimensões mais graves — e frequentemente negligenciadas — da atuação irregular do síndico: os custos pessoais, financeiros, patrimoniais e reputacionais que podem ser infligidos a quem, por desconhecimento técnico ou excesso de confiança, transgride o ordenamento jurídico e administrativo condominial. Um síndico, ainda que não remunerado ou eleito de forma voluntária, assume responsabilidade objetiva e subjetiva por atos de gestão, conforme estabelece o artigo 1.348 do Código Civil, combinado com os princípios da boa-fé objetiva, da transparência e da diligência esperada do administrador. Quando o síndico, como no exemplo de José Fulano, delibera ou executa obras sem observância dos requisitos legais — como o quórum deliberativo mínimo, a convocação formal de assembleias, ou a devida previsão orçamentária — ele incorre não apenas em infração administrativa interna, mas em responsabilidade civil plena, nos moldes dos artigos 186 e 927 do Código Civil. Em casos de prejuízo financeiro comprovado ao condomínio, os condôminos podem ingressar com ações de indenização por danos materiais e até morais, pleiteando o ressarcimento pessoal do gestor pelas despesas indevidamente realizadas, danos à estrutura predial ou descumprimento de obrigações contratuais perante terceiros. A jurisprudência nacional já reconheceu a responsabilização patrimonial direta de síndicos em diversos casos emblemáticos. Há registros de decisões que condenaram síndicos ao pagamento de indenizações que ultrapassaram a casa dos R$ 100 mil, em virtude de contratações irregulares, obras clandestinas ou desvio de finalidade orçamentária. Tais valores, somados às custas processuais, honorários advocatícios e eventuais multas judiciais por descumprimento de ordens liminares, podem levar o indivíduo à insolvência pessoal. Além disso, o nome do síndico pode ser inscrito nos cadastros de inadimplentes, ser alvo de penhora de bens, bloqueios judiciais de contas bancárias e, em situações mais graves, interdição para exercício de funções de administração condominial ou pública. O síndico passa a ser visto como figura conflitiva no ambiente comunitário, frequentemente hostilizado em assembleias, redes internas de comunicação e nos espaços comuns. Seu nome pode se tornar sinônimo de “má gestão”, fechando portas para futuras oportunidades de atuação em associações, conselhos de classe ou em empresas que exigem perfil técnico-administrativo. O desgaste moral, o isolamento social e o estigma público podem devastar a vida pessoal do gestor, inclusive afetando sua saúde mental, seu vínculo com a vizinhança e, muitas vezes, sua relação familiar. Assim, não há espaço, na administração condominial contemporânea, para improvisação ou gestão intuitiva. A figura do síndico deve ser compreendida como a de um gestor jurídico-financeiro de alta complexidade, que responde legalmente por centenas de milhares de reais em patrimônio coletivo, algumas vezes dezenas ou centenas de milhões. Sua atuação deve estar pautada em conhecimento técnico, assessoria jurídica permanente, obediência rigorosa às normas da Convenção Condominial, do Regimento Interno, das leis civis e das normas técnicas da ABNT. A negligência ou o desprezo por essas diretrizes pode não apenas comprometer a integridade estrutural e financeira do condomínio, mas arruinar irremediavelmente a vida de quem detém a caneta da administração. Ser síndico é exercer um mandato de confiança, mas também de extrema responsabilidade. Não é tarefa para aventureiros ou amadores. É uma função que exige estudo, prudência, escuta, documentação, legalidade e, sobretudo, a consciência de que o erro, quando praticado na esfera condominial, pode deixar marcas irreversíveis na coletividade — e cicatrizes profundas na trajetória pessoal de quem deveria zelar por todos. O síndico que atua fora da legalidade não apenas compromete a governança: ele compromete seu futuro.
Espero ter ajudado.
Dra. Patrícia Pereira Moreno
OAB Paraná 91.784 /PR
OAB Rio Grande do Sul 110.913A /RS
OAB São Paulo 132.664 /SP
Telefone: +55 11 94350-9099
E-mails: dra.patriciapereiramoreno@gmail.com
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