Postagens mais visitadas

Animais em Condomínio: Direitos, Deveres, Preconceito e Longevidade Humana; por Dra. Patrícia Pereira Moreno

Animais em Condomínio: Direitos, Deveres, Preconceito e Longevidade Humana; 

por Dra. Patrícia Pereira Moreno

  Em 1948 a Declaração Universal dos Direitos Humanos teve a validade certificada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, resguardando todo ser humano em sua identidade cultural, social e nas vastas características de moralidade que os compõem, prevenindo contra qualquer tipo de injustiça, desordem e ou excesso que possa ser submetido ou se fazer submisso. Mais de vinte anos depois os animais não-humanos começaram ser percebidos pela sociedade humana como dignos de atenção e direitos, como se antes disso não fossem merecedores de proteção aos “seus direitos”, os direitos de animais não humanos. Somente no ano de 1978 a Declaração Universal dos Direitos Animais foi levada à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) criada em 16 de novembro de 1945. E no ano de 1998, após uma maratona internacional, imensa batalha e campanha da ONG inglesa Uncaged contra governos, empresários e organizações predatórias, os animais começaram a ser percebidos como sujeitos morais e de direito.
  De uma forma popular, o grande passo foi clarear o pensamento de que animais são seres vivos e não objetos. Agora, atualmente já existem grandes projetos para evoluir essa clareza de pensamento ao ponto de entender que animais são membros da família, e em muitas situações os animais são a família propriamente dita. Basta olhar o crescimento das ofertas de serviços para pets e a explosão de grandes magazines segmentados que crescem de forma exponencial e progressivamente, demonstrando que os animais estão ocupando uma função importante no cerni da sociedade, agregando às famílias, completando lares, e ajudando muitos indivíduos e corações aflitos à curar a depressão-ansiedade-estresse.
  A vida moderna criou um verdadeiro exército de pessoas solitárias, ao ponto de países mais desenvolvidos como por exemplo o Reino Unido desenvolveram soluções governamentais como criação de um Ministério da Solidão para lidar com grande parte da população que vive em uma chamada “desconexão” ou sentimento de não ser compreendido pelos outros. O impacto da solidão tem gerado resultados extraordinários na indústria farmacêutica, que a cada ano vendem mais e mais antidepressivos e fármacos que auxiliam no sono, na ansiedade e principalmente no fator estresse. Muitos especialistas chegam a utilizar o termo de “epidemia da solidão no mundo”, e quando se constata um quadro de solidão crônica, as consequências podem ser muito graves, como aumento dos riscos de problemas cardíacos, pressão arterial, derrame cerebral, além da redução da expectativa de vida. 
  Basta investir alguns minutos em pesquisa na própria internet, para encontrar grandes fontes de informação fazendo referências a recentes e intensos estudos que comprovam de forma  cientifica os IMENSOS BENEFÍCIOS do vínculo humano-animal. Um ótimo exemplo é a Associação Americana de Saúde do Coração que faz menção do convívio de pessoas com animais de estimação, em especial cães, relatando a redução do risco de doenças cardíacas e elevação da longevidade. Outro ótimo exemplo são os resultados que você vai encontrar sobre “Terapia Assistida por Animais (TAA)” que utiliza o animal como co-terapeuta  no auxílio de pacientes em tratamentos diversos do Instituto Nacional de Ações e Terapias Assistidas por Animais (Inataa). Esse ponto é tão importante para ser trazido ao leitor pois elucida o porque municípios como São Paulo sancionaram em fevereiro de 2018 o Projeto de Lei nº 355/2017 promulgando a lei municipal n.º 16.827 de 6 de fevereiro de 2018 que Dispõe sobre a liberação de entrada de animais de estimação em hospitais públicos para visitas a pacientes internados, Lei essa totalmente apoiada pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp). Também é de suma e relevante importância saber que o Hospital Israelita Albert Einstein permite a entrada dos animais de estimação desde o ano de 2009, devido aos comprovados benefícios que esse relacionamento proporciona. 
  Agora, sem querer entrar na questão terapêutica, clínica ou medicinal dos benefícios da relação entre pessoas e animais, vamos para a questão do preconceito e dos direitos dos animais e de seus “familiares” em condomínios.
Tais fatos tem gerado um grande crescimento do mercado de animais de estimação, principalmente nas grandes capitais, e tem trazido uma nova forma de se pensar, projetar, construir, administrar e conviver em condomínios. Porém a barreira do preconceito ainda é GIGANTE, e é preciso paciência e em muitas vezes apoio jurídico para exercer seu direito e o direito de seu bichinho de estimação.
A título de exemplo de preconceito, no mês de Abril de 2018, eu mesma sofri um terrível desconforto em um condomínio em São Paulo Capital. Em uma visita para elaborar um orçamento de sindicatura em um condomínio paulista levei comigo minha filhinha de nome Fafá, uma graciosa e amorosa Yorkshire de 6 anos. Na verdade ela me acompanhou pois no mesmo dia eu a levaria em um grande condomínio clube na mesma capital, onde faço um trabalho de educação e convívio com animais de estimação e ela participa, onde demonstro que é absolutamente possível “civilizar” nossos fieis companheiros. Durante toda a visita a Fafá ficou em minha companhia e dentro da bolsa transportadora, e sequer emitiu um latido apenas recebeu carinho e gracejos daqueles apaixonados por animais. Pois bem, feita a visita e enviado o orçamento, uma semana depois recebi uma ligação onde me informaram que eu não poderia participar da eleição de sindicatura, pois o conselho deliberativo do condomínio em questão tinha entendido como “um absurdo” um candidato a sindico ir fazer uma visita de orçamento com um cachorro.  Bem, como eu disse é preciso muita paciência, pois o preconceito existe e infelizmente ainda existem seres que se entendem melhores que outros seres. Bem, se minha família não pode entrar nesse condomínio, eu também não posso e de certo não faço a menor questão, afinal trabalho fazendo o que amo, e não por um salário ou por mais um contrato. Nessas horas é possível indagar: “Quem realmente é irracional?”
Enfim, vamos à questão dos direitos de nossos animaizinhos, focando logicamente no convívio em condomínios. 
De uma forma geral, tanto você quantos seus familiares, visitantes e seus animais de estimação não podem interferir ou prejudicar o sossego, a saúde e a segurança dos condôminos vizinhos e usuários do empreendimento. Muitas convenções e regimentos internos que possuem mais de 2 anos, estão totalmente desatualizados e induzem o síndico a um abismo jurídico caso não se atualize. Nesses últimos anos, temos recebido milhares de demandas de São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Fortaleza, Manaus e Brasília com uma exagerada procura por membros do conselho, síndicos e condôminos com solicitações diversas de lides decorrentes de conflitos de vizinhança, de exageros regimentais, multas e constrangimento ilegais. Nossa principal constatação é que existe um exagerado desconhecimento da legislação e falta de clareza nas informações, que começam a abarrotar os tribunais especiais e de descentralização. A procura pelos serviços para atualização ajuste de convenção condominial, regimento ou regulamento interno nunca foram tão grandes e tão apressadas. Aceitação de animais nos condomínios, regras de convivência, circulação nas áreas comuns, restrição de passagens, uso da área externa, restrição ao porte e tamanho, tela na janela(alteração da fachada do prédio), mau cheiro, multar ou advertir são questões que abarrotam nossas caixas de e-mail e tiram o sono  de muitos síndicos além dos impasses e conflitos em assembleias, reuniões e convívio nos condomínios. Lembrando que quando falamos em condomínios não estamos fazendo a distinção entre verticais(prédios) e horizontais(casas) ou mistos(prédios e casas). 
  A Lei brasileira ainda está muito distante do que realmente desejamos para o reconhecimento dos nossos “companheiros” como entes familiares, mas o pensamento tem evoluído e a realidade dos fatos científicos e crescimento do mercado de pets tem forçado os governos a repensarem e apresarem o desenvolvimento jurídico nesse segmento.
  O Código Civil instituído pela LEI N° 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002, faz alguns apontamentos importantes que vou recortar e destacar na sequência: Dos Limites entre Prédios e do Direito de Tapagem; Seção VI: Dos Limites entre Prédios e do Direito de Tapagem; Artigo 1.297: O proprietário tem direito a cercar, murar, valar ou tapar de qualquer modo o seu prédio, urbano ou rural, e pode constranger o seu confinante a proceder com ele à demarcação entre os dois prédios, a aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados, repartindo-se proporcionalmente entre os interessados as respectivas despesas. §(Parágrafo) 3º A construção de tapumes especiais para impedir a passagem de animais de pequeno porte, ou para outro fim, pode ser exigida de quem provocou a necessidade deles, pelo proprietário, que não está obrigado a concorrer para as despesas. Seção VII: Do Direito de Construir; Artigo 1.313: O proprietário ou ocupante do imóvel é obrigado a tolerar que o vizinho entre no prédio, mediante prévio aviso, para: II - apoderar-se de coisas suas, inclusive animais que aí se encontrem casualmente. Do Condomínio Geral; Seção I: Do Condomínio Voluntário; Subseção I: Dos Direitos e Deveres dos Condôminos; Artigo 1.314: Cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de terceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la. Parágrafo único. Nenhum dos condôminos pode alterar a destinação da coisa comum, nem dar posse, uso ou gozo dela a estranhos, sem o consenso dos outros. Artigo 1.319: Cada condômino responde aos outros pelos frutos que percebeu da coisa e pelo dano que lhe causou. Artigo 1.335: São direitos do condômino: I - usar, fruir e livremente dispor das suas unidades; II - usar das partes comuns, conforme a sua destinação, e contanto que não exclua a utilização dos demais compossuidores; Artigo 1.336: São deveres do condômino: I - contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção (Redação dada pela Lei nº 10.931, de 2004); III - não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas; IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes. Artigo 1.339: Os direitos de cada condômino às partes comuns são inseparáveis de sua propriedade exclusiva; são também inseparáveis das frações ideais correspondentes as unidades imobiliárias, com as suas partes acessórias.
  O Código Penal instituído pelo DECRETO-LEI No 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940, traz alguns acatamentos importantes de serem destacados: Introdução ou abandono de animais em propriedade alheia; Artigo 164 - Introduzir ou deixar animais em propriedade alheia, sem consentimento de quem de direito, desde que o fato resulte prejuízo: Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, ou multa.
  A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988, faz garantias importantes as quais destaco: TÍTULO II; DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS - CAPÍTULO I - DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS; Artigo 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; XXII - é garantido o direito de propriedade;  XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; TÍTULO VII; DA ORDEM ECONÔMICA E FINANCEIRA - CAPÍTULO I - DOS PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONÔMICA; Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: II - propriedade privada; III - função social da propriedade; CAPÍTULO II - DA POLÍTICA URBANA; Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.: §(Parágrafo) 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.
  Em resumo e finalizando, é garantida à propriedade privada e autonomia do uso dessa propriedade, porém o bom senso deve estar a frente garantindo a preservação da paz, sossego, saúde e segurança dos vizinhos, sendo que o regimento interno e convenção do condomínio pode regulamentar o convívio mas JAMAIS fazer a proibição dos animais no condomínio e deve garantir o livre acesso. Assim ao invés de recorrer a “resumões” em portais e sites na internet, o que faz muitos gestores de condomínios e associações tropeçar, o mais recomendado é que todos os condomínios, representados por seu síndico busquem orientação jurídica com profissionais habilitados pela Ordem dos Advogados (OAB) para garantir um regimento e convenção condominial atualizados, evitando o abuso de autoridade, abuso de poder, constrangimento ilegal, regras inconstitucionais e demandas jurídicas custosas e na maioria dos casos, desnecessárias.

Bibliografia
http://www.planalto.gov.br/
http://www.uncaged.co.uk/
https://www.einstein.br/

Nenhum comentário:

Postar um comentário